quarta-feira, dezembro 29, 2010

O prazer da vida

Mas não o seu fruto.
É um abismo a clamar pelo céu,
Mas não é nem o abismo nem o céu.
É a ave enjaulada a voar em liberdade,
Mas não é o espaço que ela percorre.
Na verdade, o prazer é uma canção de liberdade.
Gostava que a cantasses com todo o teu coração,
Mas não quero que percas o coração ao cantá-la.
Alguns jovens buscam o prazer como se fosse tudo na vida,
E, por isso, são julgados e repreendidos.
Eu não os julgo nem os repreendo.
Prefiro dizer-lhes que partam em busca.
Não ouviste falar do homem que estava a cavar a terra
Á procura de raízes e encontrou um tesouro?
Alguns anciãos recordam os seus prazeres com remorsos,
Como se fossem erros cometidos durante a embriaguez.
Deviam recordar os seus prazeres com gratidão,
Como quem recorda as colheitas de Verão.
Os que não buscam nem recordam temem o prazer,
Pois pensam que lhes irá prejudicar o espírito.
O teu corpo conhece a sua herança
E as suas necessidades, e não se deixará enganar.
E o teu corpo é a harpa da tua alma;
Pertence-te e cabe-te a ti criar
Uma doce música ou sons confusos.
E agora perguntas, no teu coração:
"Como poderei distinguir o que é bom
do que é mau no prazer?"
Vai para os campos e jardins e verás
Que a abelha tem prazer em tirar o mel da flor,
Mas também se deleita a flor
Ao dar o seu mel à abelha.
Para a abelha, a flor é uma fonte de vida,
E, para a flor, a abelha é a mensageira do amor.
E tanto para a abelha como para a flor,
Dar e receber prazer é tanto uma necessidade
Como um êxtase.
Portanto, no prazer, sê como a abelha e a flor.

                                                                Kahlil Gibran  

sábado, dezembro 25, 2010

Reverência ao destino

Falar é completamente fácil, quando se tem palavras em mente que expressem sua opinião. Difícil é expressar por gestos e atitudes o que realmente queremos dizer, o quanto queremos dizer, antes que a pessoa se vá. Fácil é julgar pessoas que estão sendo expostas pelas circunstâncias. Difícil é encontrar e refletir sobre os seus erros, ou tentar fazer diferente algo que já fez muito errado. Fácil é ser colega, fazer companhia a alguém, dizer o que ele deseja ouvir. Difícil é ser amigo para todas as horas e dizer sempre a verdade quando for preciso. E com confiança no que diz. Fácil é analisar a situação alheia e poder aconselhar sobre esta situação. Difícil é vivenciar esta situação e saber o que fazer ou ter coragem pra fazer. Fácil é demonstrar raiva e impaciência quando algo o deixa irritado. Difícil é expressar o seu amor a alguém que realmente te conhece, te respeita e te entende. E é assim que perdemos pessoas especiais. Fácil é mentir aos quatro ventos o que tentamos camuflar. Difícil é mentir para o nosso coração. Fácil é ver o que queremos enxergar. Difícil é saber que nos iludimos com o que achávamos ter visto. Admitir que nos deixamos levar, mais uma vez, isso é difícil. Fácil é dizer "oi" ou "como vai?" Difícil é dizer "adeus", principalmente quando somos culpados pela partida de alguém de nossas vidas... Fácil é abraçar, apertar as mãos, beijar de olhos fechados. Difícil é sentir a energia que é transmitida. Aquela que toma conta do corpo como uma corrente elétrica quando tocamos a pessoa certa. Fácil é querer ser amado. Difícil é amar completamente só. Amar de verdade, sem ter medo de viver, sem ter medo do depois. Amar e se entregar, e aprender a dar valor somente a quem te ama. Fácil é ouvir a música que toca. Difícil é ouvir a sua consciência, acenando o tempo todo, mostrando nossas escolhas erradas. Fácil é ditar regras. Difícil é seguí-las. Ter a noção exata de nossas próprias vidas, ao invés de ter noção das vidas dos outros. Fácil é perguntar o que deseja saber. Difícil é estar preparado para escutar esta resposta ou querer entender a resposta. Fácil é chorar ou sorrir quando der vontade. Difícil é sorrir com vontade de chorar ou chorar de rir, de alegria. Fácil é dar um beijo. Difícil é entregar a alma, sinceramente, por inteiro. Fácil é sair com várias pessoas ao longo da vida. Difícil é entender que pouquíssimas delas vão te aceitar como você é e te fazer feliz por inteiro. Fácil é ocupar um lugar na caderneta telefônica. Difícil é ocupar o coração de alguém, saber que se é realmente amado. Fácil é sonhar todas as noites. Difícil é lutar por um sonho.

Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade,que se petrifica, e nenhuma força jamais o resgata. 
                                                                                                         
                                                    Carlos Drummond de Andrade        

segunda-feira, dezembro 20, 2010

Cherry Bomb

          Can't stay at home, can't stay at school
               Old folks say, ya poor little fool
            Down the street I'm the girl next door
              I'm the fox you've been waiting for 

                   Hello Daddy, hello Mom
             I'm your ch ch ch ch ch cherry bomb
                  Hello world I'm your wild girl
              I'm your ch ch ch ch ch cherry bomb

           Stone age love and strange sounds too
                 Come on baby let me get to you
                Bad nights cause'n teenage blues
          Get down ladies you've got nothing to lose

                       Hello Daddy, hello Mom
               I'm your ch ch ch ch ch cherry bomb
                    Hello world I'm your wild girl
               I'm your ch ch ch ch ch cherry bomb

                    Hey street boy whats your style
            Your dead end dreams don't make you smile
                    I'll give ya something to live for
                      Have ya, grab ya til your sore

                            Hello Daddy, hello Mom
                    I'm your ch ch ch ch ch cherry bomb
                            Hello world I'm your wild girl
                    I'm your ch ch ch ch ch cherry bomb

                                                                          The Runaways

Se precisa extravasar escute a boa e clássica ch ch ch ch ch cherry bomb!
                                                                                                                               

sábado, dezembro 18, 2010

Soneto XXIII

                    Como no palco o ator que é imperfeito
                  Faz mal o seu papel só por temor,
             Ou quem, por ter repleto de ódio o peito
                Vê o coração quebrar-se num tremor,
                  Em mim, por timidez, fica omitido
                     O rito mais solene da paixão;
                E o meu amor eu vejo enfraquecido,
                   Vergado pela própria dimensão.
              Seja meu livro então minha eloqüência,
                 Arauto mudo do que diz meu peito,
               Que implora amor e busca recompensa
             Mais que a língua que mais o tenha feito.
               Saiba ler o que escreve o amor calado:
                Ouvir com os olhos é do amor o fado.

                                   Soneto XXIII de William Shakespeare

quarta-feira, dezembro 15, 2010

Definitivo

Definitivo, como tudo o que é simples. Nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram. Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido juntos e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade. Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.  Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender. Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada. Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar. 
Por que sofremos tanto por amor? O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável, um tempo feliz. Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso: 
Se iludindo menos e vivendo mais!!! 
A cada dia que vivo mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade. 
A dor é inevitável. O sofrimento é opcional...

                                             Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, dezembro 14, 2010

Promessas de casamento


Em maio de 98, escrevi um texto em que afirmava que achava bonito o ritual do casamento a igreja, com seus vestidos brancos e tapetes vermelhos, mas que a única coisa que me desagradava era o sermão do padre. "Promete ser fiel na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, amando-lhe e respeitando-lhe até que a morte os separe?" Acho simplista e um pouco fora da realidade. Dou aqui novas sugestões de sermões:
- Promete não deixar a paixão fazer de você uma pessoa controladora, e sim respeitar a individualidade do seu amado, lembrando sempre que ele não pertence a você e que está ao seu lado por livre e espontânea vontade?
- Promete saber ser amiga(o) e ser amante, sabendo exatamente quando devem entrar em cena uma e outra, sem que isso lhe transforme numa pessoa de dupla identidade ou numa pessoa menos romântica?
- Promete fazer da passagem dos anos uma via de amadurecimento e não uma via de cobranças por sonhos idealizados que não chegaram a se concretizar?
- Promete sentir prazer de estar com a pessoa que você escolheu e ser feliz ao lado dela pelo simples fato de ela ser a pessoa que melhor conhece você e portanto a mais bem preparada para lhe ajudar, assim como você a ela?
- Promete se deixar conhecer?
- Promete que seguirá sendo uma pessoa gentil, carinhosa e educada, que não usará a rotina como desculpa para sua falta de humor?
- Promete que fará sexo sem pudores, que fará filhos por amor e por vontade, e não porque é o que esperam de você, e que os educará para serem independentes e bem informados sobre a realidade que os aguarda?
- Promete que não falará mal da pessoa com quem casou só para arrancar risadas dos outros?
- Promete que a palavra liberdade seguirá tendo a mesma importância que sempre teve na sua vida, que você saberá responsabilizar-se por si mesmo sem ficar escravizado pelo outro e que saberá lidar com sua própria solidão, que casamento algum elimina?
- Promete que será tão você mesmo quanto era minutos antes de entrar na igreja?
Sendo assim, declaro-os muito mais que marido e mulher: declaro-os maduros.

                                                                      Martha Medeiros 

segunda-feira, dezembro 13, 2010

Aparência X Essência

Viver em sociedade é um desafio, porque às vezes ficamos presos a determinadas normas que nos obrigam a seguir regras limitadoras do nosso ser ou do nosso não-ser. Quero dizer com isso que nós temos, no mínimo, duas personalidades: a objetiva, que todos ao nosso redor conhecem; e a subjetiva, em alguns momentos esta se mostra tão misteriosa que, se perguntarmos – Quem somos? – Não saberemos dizer ao certo.
Agora de uma coisa eu tenho certeza: sempre devemos ser autênticos, as pessoas precisam nos aceitar pelo que somos e não pelo que parecemos ser... Aqui reside o eterno conflito da aparência x essência. E você... O que pensa disso?

       “...Nunca sofra por não ser uma coisa ou por sê-la...”

  Trecho do livro Perto do Coração Selvagem (Clarice Lispector)

terça-feira, dezembro 07, 2010

A flor e a náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias, espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que triste são as coisas, consideradas em ênfase.

Vomitar este tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema resolvido, sequer colocado. 

Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam pra casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens macias avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.



                                                           Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, dezembro 03, 2010

Inteligência

Você, ser humano supostamente racional, aí vai um conselho super valioso, que você pode não entender agora, mas com o tempo irá compreender, tive a benção de ter compreendido isso cedo. O que eu vou dizer agora parecerá clichê ou banal, que você julga já compreender, mas no fundo não compreende e não age como tal...Preocupe-se mais com o seu interior do que com o exterior, procure conhecimento, respire e expire tudo o que puder que de algum modo te fará pensar ou refletir. Procure saber, faça perguntas, quem disse que fazer perguntas é vergonhoso hoje com certeza é um grande babaca. Pesquise, informe-se... não com a televisão que é marketing puro, falsa realidade! Olhe ao seu redor e veja a diferença, se quiser saber algo, comece pela realidade que está a sua volta. Procure saber de décadas passadas com certeza cada história que você ouvir ou ler, te trará muito o que pensar e comparar com a sua realidade. Procure abranger todos os seus limites e fronteiras, pesquise sobre outros países, sobre qualquer coisa do mundo, procure saber outros idiomas. Tente entender todas as implicações sociais. Aproveite ao máximo uma conversa com uma pessoa inteligente, com experiência e que quer compartilhar isso com você, tire o máximo que puder do conhecimento dessa pessoa, que um dia você poderá passar para alguém.Tudo o que você é, está dentro da sua mente. Trabalhe ela, seja inteligente. Leia livros que te faça pensar sobre toda a sua realidade quando chegar ao fim, ouça músicas que de algum modo tenta passar uma mensagem, veja filmes que te toquem no fundo da alma, converse com pessoas inteligentes, compartilhe conhecimento. Principalmente você jovem, como eu, como tantos, tente ser diferente, tente fazer a diferença, não se deixe levar pela estética, pela luxuria, por futilidades...Porque a única coisa que você irá levar realmente até o fim da vida é o conhecimento, a experiência, e quando você chegar ao fim da vida, eu realmente espero que você sinta que ultrapassou todas as expectativas do lado racional e do lado emocional de que ter conhecimento é tudo.                                                                                                                                                                                                                     

                                                                           Ana Paula Machado

quarta-feira, dezembro 01, 2010

Tristeza

Se eu disser pra você que hoje acordei triste, que foi difícil sair da cama, mesmo sabendo que o sol estava se exibindo lá fora, e o céu convidava para a farra de viver. Mesmo sabendo que havia muitas providencias a tomar, acordei triste e tive preguiça de cumprir os rituais que normalmente faço sem nem prestar atenção no que estou sentindo, como tomar banho, colocar uma roupa, ir pro computador, sair para compras e reuniões – se eu disser que foi assim, o que você me diz? Se eu lhe disser que hoje não foi um dia como os outros, que não encontrei energia nem para sentir culpa pela minha letargia, que hoje levantei devagar e tarde e que não tive vontade de nada, você vai reagir como?
Você vai dizer “te anima” e me recomendar um antidepressivo, ou vai dizer que tem gente vivendo coisas muito mais graves do que eu (mesmo desconhecendo a razão da minha tristeza), vai dizer para eu colocar uma roupa leve, ouvir uma música revigorante e voltar a ser aquela que sempre fui, velha de guerra.
Você vai fazer isso porque gosta de mim, mas também porque é mais um que não tolera a tristeza: nem a minha, sem a sua, nem a de ninguém. Tristeza é considerada uma anomalia do humor, uma doença contagiosa, que é melhor eliminar desde o primeiro sintoma. Não sorriu hoje? Medicamento. Sentiu uma vontade de chorar à toa? Gravíssimo, telefone já para seu psiquiatra.
A verdade é que eu não acordei triste hoje, nem mesmo com uma suave melancolia, está tudo normal. Mas quando fico triste, também está tudo normal. Porque ficar triste é comum, é um sentimento tão legítimo quanto à alegria, é um registro da nossa sensibilidade, que ora gargalha em grupo, ora busca o silêncio e a solidão. Estar triste não é estar deprimido.
Depressão é coisa muito mais séria, contínua e complexa. Estar triste é estar atento a si próprio, é estar desapontado com alguém, com vários ou consigo mesmo, é estar um pouco cansado de certas repetições, é descobrir-se frágil num dia qualquer, sem uma razão aparente – as razões têm essa mania de serem discretas.
“Eu não sei o que meu corpo abriga/ nestas noites quentes de verão/ e não importa que mil raios partam/ qualquer sentido vago de razão/ eu ando tão down...” Lembra da música? Cazuza ainda dizia, lá no meio dos versos, que pega mal sofrer. Pois é, pega mal. Melhor sair pra balada, melhor forçar um sorriso, melhor dizer que está tudo bem, melhor desamarrar a cara. “Não quero te ver triste assim”, sussurrava Roberto Carlos em meio à outra música.
Todos cantam tristeza, mas poucos a enfrentam de fato. Os esforços não são para compreendê-la, e sim para disfarçá-la, sufocá-la, ela que, humilde, só quer usufruir do seu direito de existir, de assegurar o seu espaço nesta sociedade que exalta apenas o oba-oba e a verborragia, e que desconfia de quem está calado demais. Claro que é melhor ser alegre que ser triste (agora é Vinicius), mas melhor mesmo é ninguém privar você de sentir o que for. Em tempo: na maioria das vezes, é a gente mesmo que não se permite estar alguns degraus abaixo da euforia.
Tem dias que não estamos pra samba, pra rock, pra hip-hop, e nem por isso devemos buscar pílulas mágicas para camuflar nossa introspecção, nem aceitar convites para
festas em que nada temos para brindar. Que nos deixem quietos, que quietude é armazenamento de força e sabedoria, daqui a pouco a gente volta, a gente sempre volta,
anunciando o fim de mais uma dor – até que venha a próxima, normais
que somos.

           Trecho do livro Doidas e Santas (Martha Medeiros)

sábado, outubro 23, 2010

Atração Instantânea


Como toda quinta feira, sai de casa com meu livro e caneta em mãos, para ir até a praça, no horário que ela está sempre vazia, de noite. Não sei por qual motivo, talvez as pessoas prefiram o sol ao invés da lua, do calor ao invés da frieza prateada da cor das estrelas, não sei, eu sempre preferi a noite. Talvez por sempre ter sido fria e solitária.
Estava caminhando pelo trajeto curto, do meu apartamento até a praça, e percebi que aquela noite estava estranhamente vazia, apesar de ainda sentir a noite, ouvir o silêncio estranho que ela nos oferece. Finalmente parei de pensar nisso, estiquei minha manta que eu sempre levo comigo no gramado fofo e verde da praça, para poder deitar e olhar as estrelas. Toda quinta faço isso, porque nesse lugar sempre me vem algum tipo de inspiração pra escrever em meu livro, fazer alguma anotação, não sei, parece que aqui é meu ponto de poder, de criatividade, de luz.
Sentei ali, fechei os olhos e fiquei sentindo o ar gelado da noite rodopiar ao meu redor, fiquei sentindo meus cabelos voarem calmamente pelos ombros, tentei pensar nas coisas que sempre me traziam algum tipo de lembrança, de inspiração, mas não veio nada, tava começando a ficar frustrada. Então deitei, abri os olhos e fiquei olhando as estrelas, que pra mim eram mais belas que qualquer luz solar, para as estrelas podemos olhar o tempo que for e os nossos olhos não irão queimar, podemos ver suas formas e diferente desenhos, o sol não me agrada nem um pouco, sim, não gosto do dia, por mim viveria apenas na noite, sinto que a noite é o meu lar...
Comecei a ter uma sensação estranha, de estar sendo observada, tinha certeza de que tinha alguém me observando. Então olhei para o lado que estava me trazendo a sensação mais estranha que já tinha sentido na vida, e vi aqueles olhos sombrios me observando, lentamente comecei a sentar, o primeiro impulso que eu tive foi de gritar, mas algo dentro de mim dizia que eu não devia fazer isso. Ele continuou ali, parado, apenas me olhando, os poucos pontos de luz que vinham dos postes distantes, formavam uma sombra sobre ele que mostrava a sua beleza estonteante e de alguma forma seu lado escuro. Ele era alto, de cabelos negros, que emoldurava um rosto pálido, mas com uma beleza indescritível, olhos azuis de uma profundidade assustadora que instantaneamente derreteu toda a frieza que me perseguia a vida inteira, maçãs do rosto altas, nariz reto, lábios perfeitamente desenhados e cheios, maxilar marcante. Ele era tão incrivelmente belo, que se eu não estivesse sentada olhando-o como uma idiota, teria dado passos impensados para o estranho que ali me observava. Será que ele estaria ali há muito tempo? Será que ele SEMPRE ia ali? Não. Aqui sempre estava vazio, em silêncio absoluto, eu estava muito confusa. Logo me toquei que a minha tagarelice mental tinha durado poucos segundos, e que aquele ser perfeitamente belo que me observava, estava se afastando dali lentamente, sem tirar os olhos dos meus, e assim ele se afastou até eu não poder mais vê-lo na escuridão da noite...
Fiquei ali, de boca aberta, pensando quem poderia ser aquele homem, que em segundos conseguiu derreter todo o gelo que existia dentro de mim, apenas com o olhar, sem me pronunciar uma palavra sequer. Só agora tinha me dado conta que devia ter perguntado quem era ele, perguntado o seu nome, mas em vez disso fiquei olhando pra ele como uma idiota. Quando já estava pensando claramente de novo, juntei minha manta, meu livro e fui andando calmamente pela calçada para casa. A única coisa que eu pensava era: Tomara que ele apareça ali de novo na próxima quinta... Apesar de qualquer lado escuro que o assombrava eu o queria conhecer e eu sentia que ia conhecer mais do que eu pretendia.
                                                                                   
                                                            Ana Paula M. Silva.

sexta-feira, outubro 22, 2010

Diferenças


Às vezes me sinto uma aberração no meio de tanto modismo, às vezes penso que estou no lugar errado, com as pessoas erradas. Porque eu tenho uma personalidade totalmente diferente de todos que me cercam, gosto de filmes diferentes, músicas diferentes, livros diferentes (se é que as pessoas que estão comigo gostam de ler), gosto de lugares diferentes, de inovar! E as pessoas que estão comigo não tem o mínimo dos pensamentos e objetivos que eu tenho. Como posso conviver assim? Queria tanto ir para algum lugar longe, onde as pessoas não sabem quem eu sou, onde eu posso ser quem eu quero ser, sem medo de julgamentos e pensamentos errados. Como eu queria sentir a liberdade completamente e ficar longe dessa esfera onde todos querem seguir padrão de beleza igual, gosto musical igual, tudo igual. Seguem essa linha de modinhas que nem sabem o que querem, o que fazem, o que ouvem e o que lêem, onde estão os princípios de todos? Não sei, só sei que eu gostaria de fugir daqui e ser quem eu quero ser.
                                                                                        
                                                         Ana Paula M. Silva.

quarta-feira, outubro 20, 2010

O GRITO

Não sei o que está acontecendo comigo, diz a paciente para o psiquiatra.
Ela sabe.
Não sei se gosto mesmo da minha namorada, diz um amigo para outro.
Ele sabe.
Não sei se quero continuar com a vida que tenho, pensamos em silêncio.
Sabemos, sim.
Sabemos tudo o que sentimos porque algo dentro de nós grita. Tentamos abafar esse grito com conversas tolas, elucubrações, esoterismo, leituras dinâmicas, namoros virtuais, mas não importa o método que iremos utilizar para procurar uma verdade que se encaixe em nossos planos: será infrutífero. A verdade já está dentro, a verdade se impõe, fala mais alto que nós, ela grita.
Sabemos se amamos ou não alguém, mesmo que esteja escrito que é um amor que não serve, que nos rejeita, um amor que não vai resultar em nada. Costumamos desviar esse amor para outro amor, um amor aceitável, fácil, sereno. Podemos dar todas as provas ao mundo de que não amamos uma pessoa e amamos outra, mas sabemos, lá dentro, quem é que está no controle.
A verdade grita. Provoca febre, salta aos olhos, desenvolve úlceras. Nosso corpo é a casa da verdade, lá de dentro vêm todas as informações que passarão por uma triagem particular: algumas verdades a gente deixa sair, outras a gente aprisiona e finge esquecer. Mas há uma verdade única: ninguém tem dúvida sobre si mesmo.
Podemos passar anos nos dedicando a um emprego sabendo que ele não nos trará recompensa emocional. Podemos conviver com uma pessoa mesmo sabendo que ela não merece confiança. Fazemos essas escolhas por serem as mais sensatas ou práticas, mas nem sempre elas estão de acordo com os gritos de dentro, aquelas vozes que dizem: vá por este caminho, se preferir, mas você nasceu para o caminho oposto. Até mesmo a felicidade, tão propagada, pode ser uma opção contrária ao que intimamente desejamos. Você cumpre o ritual todinho, faz tudo como o esperado, e é feliz, puxa, como é feliz.
E o grito lá dentro: mas você não queria ser feliz, queria viver!
Eu não sei se teria coragem de jogar tudo para o alto.
Sabe.
Eu não sei por que sou assim.
Sabe.
                                                                   Martha Medeiros.

sexta-feira, outubro 15, 2010

NASCER DO SOL E PÔR DO SOL


Eu estou com uma saudade tremenda do amanhecer e do entardecer do verão, pelo simples e espetacular nascer e pôr do sol que reina na ilha de Florianópolis nesses três meses.
Lembro-me de muitos finais de semana de verão que eu não dormia a noite inteira simplesmente pra quando estivesse perto do amanhecer eu pudesse sair de casa, sentar na areia da praia e esperar a maravilha da natureza começar a se mover timidamente por entre as nuvens. Lembro claramente como se estivesse vendo agora, os tons das cores movendo-se preguiçosamente pelo céu, refletindo na água. Primeiro vêm aquele tom de azul  marinho que lentamente, vai se tornando um roxo, depois se torna rosa, depois um tom de laranja brilhante. Não tem algo mais espetacular que isso. O pôr do sol também me agrada, pelos momentos, de ficar na praia com os amigos, conversar, brincar na água, fazer qualquer coisa na areia que renda muitas risadas e quando nos tocamos vemos o sol se pondo silenciosamente nos mostrando que chegou a hora de partir, mas que isso não significa que acabou a diversão, porque dali a algumas horas ele irá trazer sua beleza, seu brilho e calor, para nos aconchegar num ambiente maravilhosamente familiar que é o verão em Floripa.
                                                                                             
                                                                 Ana Paula M. Silva.



Nascer do sol                     Por do sol
Imagem minha, clique para ampliá-la.

domingo, agosto 22, 2010

"O QUE VOCÊ VAI SER QUANDO CRESCER?"


Esses dias eu estava pensando na pergunta "O que você vai ser quando crescer?" e me bateu uma saudade tremenda de quando eu podia responder "Vou ser grande" "Sei lá não faço a mínima idéia, tenho muito tempo pra pensar" e agora eu vejo que não era tanto tempo assim, agora quando as pessoas me perguntam isso, elas querem uma resposta séria, realmente querendo saber o que eu vou fazer da vida...
Meus pais esses últimos dias tem me pressionado tanto que a minha vontade é gritar: "EU NÃO SEI O QUE EU VOU FAZER E NEM QUERO PENSAR NISSO, MAS QUE DROGA!"
Mas na verdade eu sei o que eu quero sim, mas eu não quero o que outras 'jovens normais' querem, como, se formar, ter um bom emprego e uma boa família. Minha vontade é aprender o inglês e tocar violão, pegar ele e minha mochila e ir embora pra Londres, a cidade do Rock. Muitas pessoas vão ler isso e pensar que menina problemática olha o que ela quer, mas enfim, sei que em pelo menos 100 pessoas 1 delas tem a mesma vontade que eu, mas como minoria, somos considerados, idiotas e sonhadores... Mas eu tenho que dizer que quem não sonha não vive, pelo simples fato de não ter porque lutar, e não ter o gosto da conquista.
Então, você que passa horas roendo suas unhas e arrancando os cabelos pensando no que você vai ser quando crescer, apenas sonhe! Quando dizem que viver de sonho não é bom é mentira, não é bom apenas pra quem NÃO tem sonhos, mas pra quem tem é maravilhoso. E na hora certa você vai descobrir o seu 'dom'.                                                                                       
                                                              Ana Paula M. Silva.

sábado, agosto 21, 2010

QUERIDO DIÁRIO FRUSTRADO...

Sempre quis ter um diário, mas nunca soube pra que usá-lo exatamente, pra que servia... Lembro quando sempre começava a escrever um, e eu nunca passava de uma semana escrevendo nele (isso é o que pode acontecer com esse Blog) eu tenho o péssimo hábito de nunca terminar o que eu começo. Eu pensava, pra que eu vou fazer um diário se os meus dias são incrívelmente chatos e quando algo de interessante acontece é só uma vez na vida e outra na morte. Acho que vocês irão começar a compreender o nome do Blog, Diário Frustrado, na minha vida vem uma frustração atrás de outra, agora mesmo eu estava com uma vontade de comer alguma coisa com queijo mais eu não sabia o que, e isso me deixou frustrada, tive que me contentar com bis (pelo menos o bis era branco)...
Eu não faço nada de interessante, mas pelo menos penso coisas que eu acho poderiam ser compartilhadas. Na verdade, eu queria 'escrever de verdade', com caneta, sentir o cheiro das folhas do livro, mas eu sei que eu perderia esse livro em menos de uma semana, e isso também iria me frustrar, um "diário virtual" é mais seguro comigo, pelo menos eu não perderei ele... pelo menos eu acho (com a minha sorte quem sabe né).
Enfim, como eu irei postar nele quase todos os dias (pelo menos é o que eu pretendo), vocês irão saber muito mais de mim, tá eu sei que ninguém vai ler esse Blog, mas enfim, isso aqui é só pra mim de uma certa forma "desabafar" mesmo.


                                                               Ana Paula M. Silva.